Nilson Araújo de Souza
O Brasil nasceu como um projeto colonial da metrópole portuguesa – portanto, sob o signo da dependência externa. Com a subordinação econômica de Portugal ao nascente capitalismo inglês, a partir do começo do século XVIII, com base no Tratado de Methuen[1], a nova colônia passou a servir a dois senhores: o ouro que era aqui extraído servia para Portugal pagar suas dívidas com a Inglaterra, ao mesmo tempo em que o Brasil passou a ser um importante escoadouro dos produtos industriais que, através de Portugal, vinham da Inglaterra.
O economista Celso Furtado chegou a propugnar que esse duplo mecanismo – transferência do ouro brasileiro para a Inglaterra e aquisição de seus produtos industriais – foi um dos principais propulsores da industrialização inglesa[2].
A independência política do Brasil no começo do século XIX não resolveu esse problema, pois a Inglaterra foi crescentemente assumindo o lugar de Portugal no domínio econômico sobre o Brasil, situação que se consolidou durante o período da República Velha, nas três primeiras décadas do século XX. Nessa época, o eixo da economia brasileira passara a ser a produção e exportação do café. Reproduzia-se com a República a economia agro-exportadora que caracterizara o Brasil desde sua origem colonial[3]. E, nessa economia, cabia aos bancos ingleses aportar os recursos financeiros para a produção, transporte e comercialização do café[4] e aos industriais ingleses fornecer produtos manufaturados para o Brasil.
No entanto, como conseqüência da Grande Depressão de 1929-30[5], a economia agro-exportadora fundada no café e atrelada aos interesses ingleses entrou em colapso a partir de 1930. Em meio à crise, ocorreu uma importante mudança política no País, que conduziu ao poder forças políticas que, durante a década de 1920, haviam realizado vários enfrentamentos com os governos da República Velha. Lideradas por Getúlio Vargas, aproveitaram-se da crise econômica para retomar o projeto industrializante ensaiado nos primeiros anos da República. Ao mesmo tempo, implementou-se uma legislação de proteção ao trabalho que ainda hoje, nos seus traços fundamentais, vigora no País. A transição definitiva de uma economia agro-exportadora para uma economia urbano-industrial moderna tornou-se a características principal desse novo período[6]. Designado de industrialização por substituição de importações[7], esse período, do ponto de vista ideológico, passou a ser conhecido como nacional-desenvolvimentismo[8].
o esgotamento do modelo agro-exportador baseado no café
O deslocamento do eixo dinâmico da economia brasileira para o café a partir de meados do século XIX[9] provocou um forte impulso ao crescimento econômico do País: da década de 1840 à de 1890, a renda real gerada pelo setor exportador brasileiro cresceu 396%[10]. Ao mesmo tempo, contribuiu fortemente à transição do trabalho escravo para o assalariado e transferiu para o centro-sul o núcleo central do desenvolvimento econômico do País.
Mas o modelo agro-exportador baseado no café se esgotou ao longo dos anos 1920[11]. A crise desse modelo, que culminou com seu colapso em 1930, resultou do conjunto das suas contradições.
A primeira contradição decorre da vulnerabilidade característica de um modelo que, além de depender da exportação de praticamente um único produto primário, ainda se subordina à lógica do financiamento externo e do abastecimento do mercado interno por produtos industriais importados. Diante de qualquer crise mundial, uma economia com essas características tende a ser fortemente impactada.
Essa contradição principal se manifestava numa outra: o violento processo de urbanização resultante da intensificação do comércio exterior não se fazia acompanhar por um avanço correspondente da industrialização, resultando em desemprego e inflação. Até então, havia ocorrido apenas alguns surtos industrializantes, sem que o processo de industrialização enquanto tal se consolidasse.
Eram várias as razões que bloqueavam a industrialização:
- a prática do livre comércio com a Inglaterra abria nossas fronteiras para os produtos industriais ingleses, inviabilizando a implantação da indústria infante no País;
- a política de valorização do café garantia enorme rentabilidade para esse setor, deslocando para ele quase todos os capitais e recursos governamentais;
- a preponderância da concentração fundiária limitava o desenvolvimento do mercado interno para produtos industriais;
- a política estatal, hegemonizada pelos cafeicultores paulistas, era totalmente hostil à indústria, salvo nos momentos iniciais da República.
Essas contradições se manifestaram de maneira mais evidente a partir da segunda metade dos anos 1920. Já a partir de 1924, a indústria, que ainda não lograra um desenvolvimento auto-sustentado, entrou em decadência. Por outro lado, ao mesmo tempo que a produção de café, alavancada pela garantia de compra dos excedentes[12], dobrava de 1925 a 1929, as exportações do produto se estabilizavam. Segundo Furtado, “em 1927-29 as exportações apenas conseguiam absorver as duas terças partes da quantidade produzida”[13]. Nesse último ano, “o valor dos estoques acumulados sobrepassou dez por cento do produto territorial bruto do ano”[14]. Com a indústria em declínio e as exportações do café estacionadas, crescia o desemprego nas grandes cidades. Simultaneamente, a inflação recrudescia.
Crescia, em conseqüência, o descontentamento entre os vários setores urbanos. O nascente empresariado industrial, impedido de desenvolver seus negócios, clamava por melhores condições para viabilizar um programa industrializante; as camadas médias urbanas, representadas sobretudo por intelectuais e militares, mostravam sua insatisfação através de movimentos culturais[15] ou levantes militares[16]; os trabalhadores urbanos, que haviam realizado uma ampla paralisação em 1917, também participaram ativamente das mobilizações dos anos 1920, particularmente a partir de 1927-28, culminando com a criação, em 1929, da Confederação Geral dos Trabalhadores.
a Grande Depressão e o estrangulamento externo
Quando deflagrou-se a Grande Depressão na economia mundial, a partir de 28 de outubro de 1929[17], a economia brasileira já se encontrava em situação bastante fragilizada.
Fundada num modelo agro-exportador – que dependia praticamente de um único produto de exportação[18] para viabilizar a aquisição externa de produtos industriais e o pagamento dos encargos da crescente dívida externa -, nossa economia já amargava as conseqüências do estancamento das exportações de café desde meados dos anos 1920[19].
Com isso, ao mesmo tempo em que parara de crescer a obtenção de divisas externas, aumentavam os encargos de uma dívida externa que crescia aceleradamente para financiar os estoques do produto. Além disso, o mercado brasileiro era inundado por produtos industriais importados[20].
Portanto, já se anunciava no horizonte a possibilidade de haver um colapso nas contas externas do País[21], que foi muito bem definido por Maria da Conceição Tavares como “estrangulamento externo”[22].
A crise mundial provocou dois efeitos imediatos sobre a economia brasileira:
-
caíram violentamente os preços internacionais dos produtos primários, acarretando uma forte queda das exportações de países, como o Brasil, que baseavam suas economias na produção e exportação desses produtos;
-
tornaram-se escassos os créditos externos que vinham contribuindo para financiar a retenção dos estoques do café, com base no Acordo de Taubaté[23].
Examinemos essa situação. O preço internacional do café pago ao produtor caiu de 22,5 centavos de dólar por libra-peso em setembro de 1929 para 8 centavos em setembro de 1931, isto é, cerca de 60%[24]. O resultado foi a queda do valor das exportações totais de R$ 445,9 milhões em 1929 para US$ 180,6 milhões em 1932[25], ou seja, 59,5%. Se medido pelo seu poder de compra[26], a queda foi 43,6%[27].
Produziu-se, então, uma forte crise cambial. Enquanto as exportações despencavam, havia, como vimos anteriormente, uma intensa pressão pelo aumento da importação de produtos industriais para abastecer o mercado interno, engendrando um importante déficit comercial. Ao mesmo tempo, na balança de serviços[28], se incrementavam rapidamente as remessas para servir aos encargos da dívida externa[29], ao passo que, na balança de capitais[30], não entravam os novos empréstimos para fazer face a essas necessidades. Em suma, caía drasticamente a entrada de divisas estrangeiras, enquanto cresciam os compromissos internacionais do País. Deu-se o estrangulamento externo de que nos fala Conceição Tavares.
Para fazer face a esses compromissos, o governo recorreu de imediato às reservas cambiais[31], mas elas se evaporaram rapidamente[32], deixando o País em estado de insolvência externa. Veremos adiante que os problemas de balanço de pagamentos só seriam resolvidos depois que o governo adotou um conjunto de medidas visando conter as importações e substituí-las por produção interna.
As economias primário-exportadoras, integradas, de forma subordinada, à dinâmica da economia mundial, recebem os impactos das crises mundiais através de suas contas externas, mas seus efeitos rapidamente se espalham para o resto da economia. Com o Brasil, não era diferente. Segundo Furtado, “a redução da renda monetária, no Brasil, entre 1929 e o ponto mais baixo da crise, se situa entre 25 e 30 por cento”[33].
O mecanismo era o seguinte: ao cair a renda proveniente da exportação do café, o setor cafeeiro reduzia os pagamentos de salários e as compras no mercado interno. Com isso, o comércio e a indústria nascente, com menos consumidores, reduziram a produção e o emprego. E assim a economia foi-se encolhendo. Era o esgotamento definitivo do modelo agro-exportador baseado no café.
o programa econômico-social da Revolução de 1930
Coincidiu com a crise econômica que assolou o País o processo sucessório presidencial. Sob a liderança de Getúlio Vargas, que fora ministro da Fazenda e era presidente do Rio Grande do Sul[34], constituiu-se a Aliança Liberal, de oposição, para enfrentar o candidato oficial, Júlio Prestes, presidente de São Paulo e representante do Partido Republicano Paulista (PRP).
A plataforma de Vargas galvanizou o descontentamento das várias camadas urbanas que, como vimos antes, havia se acumulado na década de 1920 e que recrudescera durante a crise econômica. Mas na época o voto nem era secreto nem universal, deixando o eleitor à mercê do poder econômico e político local[35]. Além disso, como não havia justiça eleitoral e quem comandava o processo eleitoral eram as autoridades governamentais locais, não havia como garantir a lisura do pleito. Em meio a muitas denúncias de fraude, foi anunciada a vitória de Júlio Prestes[36].
Mas o assassinato do candidato a vice de Getúlio Vargas, o presidente da Paraíba, João Pessoa[37], terminou provocando um movimento revolucionário que levou à renúncia do presidente Washington Luiz e à constituição de um Governo Provisório, sob a chefia de Getúlio Vargas, que assumiu a 3 de novembro de 1930 para cumprir o mandato até 1934[38]. Era o fim da “República Velha”.
O programa getulista começara a ser esboçado durante sua campanha eleitoral. No lançamento de sua candidatura, a 2 de janeiro de 1930, na então capital da República, Rio de Janeiro, diante de 100 mil pessoas, propusera, dentre outras coisas, instituir o voto universal e secreto, o ensino público geral, apoio à produção industrial nacional e garantia de salário e repouso remunerado[39].
A 3 de outubro de 1930, Getúlio deflagrou o movimento revolucionário que o levaria ao poder, e no dia seguinte publicaria nos jornais seu manifesto programático. O objetivo de seu movimento, conforme declarou, seria “readquirir a liberdade, para restaurar a pureza do regime republicano, para a reconstrução nacional”.
No discurso de posse, a 3 de novembro de 1930, apresentou um programa de 17 pontos, dos quais se destacam os seguintes:
- “difusão intensiva do ensino público, principalmente técnico-profissional”;
- “reforma do sistema eleitoral, tendo em vista principalmente a garantia do voto”;
- “feita a reforma eleitoral, consultar a Nação sobre a escolha dos seus representantes, com poderes amplos de constituintes”;
- “rever o sistema tributário, de modo a amparar a produção nacional”;
- “instituir o Ministério do Trabalho, destinado a superintender a questão social, o amparo e a defesa do operariado urbano e rural”[40].
Esse programa inicial pode ser resumido em quatro pontos básicos: garantia do direito do voto, proteção à economia nacional, proteção ao trabalho e ensino público. Esses pontos foram sendo melhor definidos ao longo do governo e novos elementos programáticos foram sendo acrescentados.
enfrentamento da crise cambial
As primeiras medidas econômicas adotadas pelo novo governo visaram ao equacionamento da crise cambial e à manutenção da demanda agregada e do nível de emprego.
Para enfrentar os problemas do balanço de pagamentos, o governo de Getúlio Vargas adotou as seguintes medidas:
- em agosto de 1931, “suspendeu parte dos pagamentos da dívida externa e iniciou negociações para chegar a um acordo sobre sua consolidação”[41];
- “o Brasil também foi o primeiro país da América Latina a introduzir o controle de câmbio e outros controles diretos”[42];
- o governo sustentou a desvalorização da moeda nacional, que tinha como fundamento a escassez de moeda estrangeira provocada pela queda das exportações e dos créditos externos[43];
- por fim, o governo elevou as tarifas de importação[44].
A escassez da moeda estrangeira, determinado pela queda das exportações e dos créditos externos e pelo fim das reservas, provocou o seu encarecimento ou, dito de outra, a desvalorização da moeda nacional[45]. Além desse mecanismo natural, o governo sustentou essa desvalorização.
Com a moeda estrangeira mais cara, também encareceram, em moeda nacional, os produtos importados[46]. Esse encarecimento se deu também pela imposição de tarifas de importação. As importações foram igualmente dificultadas através do controle cambial e de outros controles diretas sobre a pauta de compras externas.
O resultado foi a violenta queda no valor das importações: de US$ 416,6 milhões em 1929 para US$ 108,1 milhões em 1932[47]. Segundo Celso Furtado, o quantum das importações experimentou uma queda “superior a 60 por cento” entre 1929 e o ponto mais baixo da depressão. “Consequentemente, o valor das importações baixou de 14 para 8 por cento da renda territorial bruta”[48].
Como as importações caíram mais que as exportações, o déficit comercial potencial se transformou em superávit de US$ 72,5 milhões em 1932[49].
Mesmo assim, os encargos da dívida externa e as remessas de lucros para o exterior seguiam comprometendo as contas externas, impedindo que elas se equilibrassem. Foi por isso que, em agosto de 1931, antes que a situação se deteriorasse mais, o governo brasileiro suspendeu parte dos pagamentos da dívida externa e congelou a remessa de lucros para o exterior.
defesa da demanda agregada e do emprego
A defesa da demanda agregada e do nível do emprego teve como sustentação a nova política de defesa do café. Houve várias mudanças em relação à política anterior, que fora consagrada em 1906 no Acordo de Taubaté. Vejamos as principais delas:
- o governo federal passou a assumir diretamente o comando da política de defesa do café que antes era controlada pelos governos estaduais do sudeste, sobretudo o de São Paulo; para isso criou em maio de 1931 o Conselho Nacional do Café, subordinando-o em setembro do mesmo ano ao Ministério da Fazenda[50];
- em lugar de promover o aumento do preço do café, como queriam os cafeicultores[51], o governo decidiu trabalhar para impedir que ele seguisse caindo;
- os recursos para a compra do excedente do café, em lugar de provirem de créditos externos (que levavam ao endividamento externo do País), passaram a ser proporcionados pelo governo através de emissões monetárias que alavancavam o crédito[52];
- para que os estoques de café não pressionassem para baixo seus preços[53], o governo passou a destruir os estoques acumulados, obtendo-se, “dessa forma, o equilíbrio entre a oferta e a procura a nível mais elevado de preços”[54]; de 1931 a 1944, destruíram-se 26,96% do café produzido no período, sendo que a média do biênio 1932-33 atingiu 41,33%[55];
- a política anterior de valorização e, portanto, de aumento da rentabilidade do setor cafeeiro – que proporcionava o aumento da produção e dos estoques invendáveis – foi substituída por uma política que promovia a progressiva substituição dessa atividade por outras atividades econômicas, sobretudo a industrial[56].
Esse política produziu os resultados esperados. Ao mesmo tempo em que a política de compra e destruição dos estoques contribuiu para a defesa imediata do nível da demanda agregada e do emprego, a atividade cafeeira foi progressivamente perdendo peso na economia nacional.
A produção cafeeira ainda cresceu até 1933 devido aos plantios realizados em 1927-28, ainda no contexto da política de valorização anterior. Assim, a produção, que fora de 1.301.670 toneladas em 1931, chegou a 1.776.600 toneladas em 1933[57]. No entanto, já como efeito da nova política, começou a diminuir a partir de então. Salvo no ano de 1936, quando teve um repique, a produção continuou caindo até 1944, quando atingiu apenas 686.686 toneladas[58].
O efeito da política de defesa do café sobre a demanda agregada e o emprego foi bem analisado por Celso Furtado. Demonstrou ele que,
dessa forma, a política de defesa do setor cafeeiro nos anos da grande depressão concretiza-se num verdadeiro programa de fomento da renda nacional. Praticou-se no Brasil, inconscientemente, uma política anticíclica da maior amplitude que a que se tenha sequer preconizado em qualquer dos países industrializados[59].
Isto ocorria, conforme Furtado demonstrou, porque
o valor do produto que se destruía era muito inferior ao montante da renda que se criava. Estávamos, em verdade, construindo as famosas pirâmides que anos depois preconizaria Keynes[60].
O mecanismo era o seguinte: a compra e destruição dos excedentes do café mantinham a renda e o emprego no setor cafeeiro, viabilizando sua demanda junto aos demais setores da economia. Graças a esse mecanismo, segundo Furtado,
a produção industrial, que se destinava em sua totalidade ao mercado interno, sofre durante a depressão uma queda de menos de 10 por cento, e já em 1933 recupera o nível de 1929. A produção agrícola para o mercado interno supera com igual rapidez os efeitos da crise[61].
Dados compilados mais recentemente por Villela e outros, com base no Anuário Estatístico e no Recenseamento Geral, do IBGE, mostram que, em 1931, a produção industrial já era 3,1% superior à de 1930, sendo que a da indústria de transformação alcançara 3,5%, conforme se pode ver pela tabela abaixo.
Tabela 1.1
Brasil: índice de produção industrial, 1929-39
Setores/anos | 1929 | 1930 | 1931 | 1932 | 1933 | 1934 | 1935 | 1936 | 1937 | 1938 | 1939 |
Total. | 100,0 | 95,2 | 103,1 | 103,4 | 118,6 | 133,9 | 152,9 | 174,9 | 187,1 | 199,4 | 224,6 |
Mineração | 100,0 | 91,1 | 85,8 | 82,3 | 86,2 | 85,0 | 96,3 | 104,5 | 128,3 | 140,1 | 137,7 |
Transformação | 100,0 | 95,3 | 103,5 | 103,9 | 119,3 | 135,1 | 154,2 | 176,5 | 188,4 | 200,7 | 226,6 |
Fonte: Villela, Annibal, Silva, Sérgio R. da, Suzigan, Wilson e Santos, Mário J. Aspectos do crescimento da economia brasileira. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1971.
A produção de meios de produção (se medida por ferro, aço e cimento) pouco sofreu com a crise e também voltou a crescer já a partir de 1931. O conjunto da renda nacional brasileira voltou a crescer desde 1933, quando nos EUA e demais países desenvolvidos “os primeiros sinais de recuperação só se manifestam em 1934”[62].
deslocamento do eixo dinâmico
As medidas de defesa da demanda agregada, ancoradas na política de defesa do café, somadas às medidas de combate à crise cambial, não se limitaram a reativar a economia existente, isto é, nos moldes do modelo agro-exportador. Tiveram um decisivo papel no sentido de promover o que Celso Furtado designou de “deslocamento do eixo dinâmico”. Isso se traduziu na reorientação da economia nacional, a qual transitou de um modelo agro-exportador para um urbano-industrial.
Antes, já haviam ocorrido alguns surtos industriais[63], mas nenhum se consolidara. Assim, pode-se dizer que a industrialização brasileira propriamente dita, isto é, a industrialização enquanto processo, é um fenômeno típico do pós-1930.
A industrialização brasileira é conhecida como industrialização por substituição de importações porque passou a produzir internamente os produtos que antes o País importava[64].
Havia na época a premissa de que a economia brasileira só poderia emergir da crise depois que os países centrais se levantassem. Nesse caso, os preços do café e de outros produtos agrícolas exportados pelo Brasil voltariam a subir, garantindo os lucros dos exportadores e mais recursos para o Estado. E, assim, o País retomaria sua “vocação natural”, que seria a manutenção do modelo primário-exportador.
O governo de Getúlio mudou essa atitude. Sua concepção era a de que a economia brasileira poderia e deveria retomar o crescimento independente da dinâmica da economia mundial, e que, para isso, seria necessário mudar o modelo econômico. Foi essa conclusão a que chegaram os debates dentro do Conselho Federal de Comércio Exterior, criado e presidido pelo próprio Presidente da República[65].
O debate central travou-se entre o principal líder empresarial da época, o engenheiro-economista Roberto Simonsen[66], e o engenheiro-economista Eugênio Gudin. Enquanto este último defendia uma suposta vocação agrícola da economia brasileira[67], o primeiro pregava que “a industrialização de um país como o Brasil é indispensável para que ele possa atingir um estágio de alta civilização”[68].
Na época, triunfaram as teses de Simonsen. Ele propunha que, para viabilizar a industrialização, dever-se-ia praticar o protecionismo e a ação do Estado na economia[69].
Esse caminho foi perseguido pelo governo Vargas desde o início. Além da ação estatal no sentido de defender a demanda agregada e proteger a indústria nascente, como vimos anteriormente, foi adotado um mecanismo que viabilizou a transferência de excedentes econômicos da agricultura cafeeira para a indústria. Era a forma de aportar a poupança necessária aos investimentos industriais.
O mecanismo era engenhoso: os exportadores de café recebiam, em moeda nacional, um valor inferior à taxa de câmbio estabelecida; por outro lado, os industriais que queriam adquirir no exterior máquinas e equipamentos para viabilizar seus investimentos tinham o beneplácito de comprar a moeda estrangeira por um valor inferior à taxa de câmbio.
Era uma transferência via câmbio de renda do café para a indústria. Apelidou-se esse mecanismo de “confisco cambial”. Na verdade, essa é uma meia-verdade. De um lado, porque parte da renda agrícola era garantida pelo próprio Estado através da aquisição dos excedentes cafeeiros; de outro, porque, além de outras medidas destinadas a ajudar financeiramente os produtores de café, o governo reduziu, em 1933, suas dívidas bancárias em 50%[70].
Os resultados foram imediatos. Vimos antes que, já em 1931, iniciou-se a recuperação industrial (ver tabela 1.1), quando esse processo só ocorreu em 1934 nos países desenvolvidos[71]. Em 1933, a produção industrial já superava em cerca de 20% o nível de 1929 (ver tabela 1.1) e, em 1937, já crescera mais 68%, representando o dobro de 1929 (tabela 1.1). Estimulada pelo crescimento da demanda industrial, a produção primária para o mercado interno cresceu em mais de 40% no mesmo período e a renda nacional cresceu 20%[72].
indústria de base e mercado interno: pilares da industrialização
Foi a industrialização que alavancou o crescimento da economia: na década de 1930, enquanto a produção industrial crescia a 7,2% ao ano, a agrícola só avançava a 2,8%; nos primeiros cinco anos da década seguinte, o crescimento foi, respectivamente, de 9,2% e 2,4%[73].
A nossa industrialização contou com dois pilares fundamentais: a implementação da indústria de base[74] e a dinamização do mercado interno.
A consciência da importância da indústria de base consolidou-se a partir de 1937. Na Mensagem de novembro de 1937, que instituiu o Estado Novo, o governo de Getúlio anunciou que a industrialização, a infra-estrutura de transportes e comunicações e a defesa nacional exigiam a instalação da grande siderúrgica e a fundação, de maneira definitiva, das “nossas indústrias de base”.
Em junho de 1939, lançou o Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional, que tinha como primeira medida a “instalação da indústria de base, sobretudo a siderúrgica”.
Foi com essa consciência que se começou a construir, a partir de 1942, a primeira siderúrgica estatal brasileira, a Usina de Volta Redonda, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). O Brasil havia decidido participar da II Guerra ao lado do aliados contra o Eixo nazi-fascista. Depois disso, o governo dos EUA[75] pleiteou a cessão de um território em Natal (RN) a fim de construir uma base aero-naval que pudesse facilitar o deslocamento de tropas para o norte da África. O governo brasileiro negociou, em troca, o apoio financeiro e técnico para construir a usina siderúrgica.
Na mesma época, com o objetivo de garantir os minérios necessários à siderurgia e a industrialização, o governo criou a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).
A dinamização do mercado interno foi outro pilar importante da industrialização brasileira. A indústria nascente destinou-se, inicialmente, a substituir importações, ou seja, a produzir para o mercado interno os produtos que antes eram importados. Mas a continuidade e consolidação do processo de industrialização demandavam que esse mercado fosse ampliado. O instrumento utilizado para esse fim foi a legislação trabalhista.
É evidente o caráter social da legislação trabalhista, mas, ao proteger e valorizar o trabalho, haveria de provocar um efeito econômico: a melhoria do poder de compra dos trabalhadores passou a dinamizar o mercado interno.
Essa legislação foi sendo instituída ao longo do tempo. Já no mês em que Getúlio chegou ao poder, em novembro de 1930, criava o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio; em março de 1931, foram decretadas a lei dos 2/3[76] e a lei da sindicalização[77] e, em setembro do mesmo ano, foi instituída a Previdência Social; em março do ano seguinte, foi decretada a jornada de 8 horas[78]; em maio de 1938, foi criado o salário mínimo, que passaria a vigorar a partir de 1941.
Toda essa legislação de proteção ao trabalho, adicionada a outras conquistas, como o descanso semanal, as férias e a licença-gestante remunerados, proteção ao trabalho do menor, instituição da segurança do trabalho, jornada de 6 horas para bancários, telefonistas, mineiros e outras categorias profissionais, foi consolidada, em 1º de maio de 1943, num único texto legal: a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), documento que ainda hoje, em seus aspectos fundamentais, regula as relações de trabalho no País.
Os resultados dessas medidas podem ser medidos em termos quantitativos. Enquanto a produção nacional, medida em termos físicos, aumentou em pouco mais de 100% de 1939 a 1954, o volume real dos gastos de consumo da população – indicativo do crescimento do mercado interno – cresceu em mais de 130%. Apesar disso, a taxa de investimento[79] não baixou: ao contrário, subiu de 12,9% para 14,3%[80].
mudanças enfrentam obstáculos
Essas transformações econômico-sociais enfrentaram importantes obstáculos.
O primeiro deles originou-se dos setores sociais beneficiários da economia agro-exportadora que perdia peso para a industrialização, sobretudo os cafeicultores paulistas. Estavam, portanto, contra as mudanças em curso. Promoveram um levante armado em São Paulo, a partir de 9 de julho de 1932.
O objetivo declarado era garantir a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte para dotar o País de uma nova Constituição. Por isso, chamaram seu movimento de “Revolução Constitucionalista”. No entanto, o governo de Getúlio Vargas já havia convocado, em maio daquele ano, as eleições para a ANC a realizar-se em 1934, e já havia, inclusive, editado as normas eleitorais, incluindo o voto universal e secreto, o voto feminino[81] e a Justiça Eleitoral[82].
Em seu Diário, Getúlio anotou na época:
Revolução Constitucionalista? Não, porque a data das eleições estava marcada e os tribunais eleitorais já constituídos! As reivindicações da autonomia paulista? Tampouco. Tudo já fora atendido, até mesmo a mudança do comando da Região. Tão satisfeitos estavam eles com o seu governo que o mantiveram. A Revolução de São Paulo foi um movimento reacionário para se apoderar do governo, falsamente rotulado de constitucionalista[83].
Malogrado o levante de São Paulo, o governo de Getúlio enfrentaria três anos depois, em 1935, um outro levante, dessa vez promovido por setores que queriam promover as mudanças, mas estavam insatisfeitos com seu ritmo.
Esses setores se organizaram na Aliança Nacional Libertadora (ANL), liderada por Luiz Carlos Prestes, que se tornara célebre durante a Coluna Miguel Costa-Prestes nos anos 1920. Em sua carta de adesão ao movimento, Prestes declarou:
Quero combater, lado a lado, com todos os que (…) desejam lutar pela libertação nacional do Brasil, com todos os que queiram acabar com o regime feudal em que vegetamos e defender os direitos democráticos que vão sendo sufocados pela barbárie fascista ou fascistizante[84].
Mas, no momento marcado para a realização de insurreições populares, o movimento reduziu-se a três levantes militares[85] que não conseguiram galvanizar sequer a parcela da população que apoiara a ANL no período de sua mobilização pacífica.
O mandato de Getúlio encerraria em 1934, mas a Constituinte eleita naquele ano concedeu-lhe mais quatro anos de mandato, sem direito a nova reeleição. Deveria, portanto, haver eleições presidenciais em 1938. Mas, a 10 de novembro de 1937, Getúlio suspendeu as eleições e começou a implantar o que ele designou de “Estado Novo”.
Na Mensagem que leu naquela data, expôs os motivos da sua decisão. Segundo ele, “os preparativos eleitorais foram substituídos, em alguns Estados, pelos preparativos militares, agravando os prejuízos que já vinham sofrendo a Nação”. Ainda segunda a mensagem, o principal candidato de oposição, Armando Salles de Oliveira, interventor de São Paulo e vinculado aos cafeicultores, teria mandado ler na tribuna da Câmara dos Deputados um documento conclamando os militares à insubordinação.
Parecia estar sendo preparada uma nova ação militar contra o governo. Isso num quadro em que a retomada da crise mundial voltara a repercutir na economia brasileira e em que a Câmara dos Deputados paralisara a votação das leis complementares que condensavam o projeto do governo. Para Getúlio, isso significava que, “quando os meios de governo não correspondem mais às condições de existência de um povo, não há outra solução senão mudá-los, estabelecendo outros moldes de ação”.
Logo depois, em 1938, como a revelar que estaria de fato havendo preparativos militares, a Ação Integralista Brasileira, liderada por Plínio Salgado – e que fora um dos candidatos presidenciais nas eleições marcadas para 1938 -, tentou invadir o Palácio do Catete a fim de assassinar o Presidente e tomar o poder. A tentativa frustrada de golpe contou com o apoio do outro candidato de oposição, Armando Salles de Oliveira. O objetivo da AIB era levar o Brasil a aproximar-se do Eixo nazi-fascista da Alemanha e Itália.
Ao mesmo tempo em que tomava as medidas destinadas a implantar o Estado Novo, Getúlio adotou um conjunto de medidas de caráter econômico e social:
- suspendeu o pagamento dos juros e amortizações da dívida externa, cujos pagamentos haviam sido retomados em 1934 e estavam, segundo ele, em face da crise mundial, debilitando a economia nacional;
- suspendeu o “sistema de valorizações artificiais de compra e queima” do café que vinha sendo adotado;
- começou a implantar a indústria de base, a começar pela construção da Usina de Volta Redonda;
- ampliou as atribuições do Conselho Federal de Comércio Exterior de forma a que passasse a exercer provisoriamente as funções do futuro Conselho de Economia Nacional, o qual passaria a operar como órgão central de planificação; logo depois, começaria a ser elaborado o Plano Qüinqüenal;
- acelerou a adoção de medidas trabalhistas, consolidando-as na CLT.
O Estado Novo duraria até 1945. Naquele ano, Getúlio convocou, para o ano seguinte, eleições gerais e para uma Assembléia Nacional Constituinte. E, para disputá-las, formaram-se os partidos políticos. A União Democrática Nacional (UDN) passa a abrigar os opositores ao getulismo. Em apoio ao getulismo, constituiu-se, a partir de suas bases sindicais, o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Criou-se, também, o Partido Social Democrata (PSD), que oscilava entre os dois polos. Por fim, legalizou-se o Partido Comunista (PCB), que fora fundado em 1922.
Convocadas as eleições, abriu-se uma forte disputa política. De um lado, a UDN pressionava pela saída de Getúlio antes das eleições. Por outro lado, o PTB, com apoio do
PCB e de parcelas do PSD, defendia que as eleições, sobretudo as constituintes, ocorressem com Getúlio no poder. Para mobilizar a sociedade, o PTB e seus aliados criaram o “Movimento Queremista”[86].
O pretexto usado pela UDN para pressionar pela saída de Getúlio era seu suposto interesse em continuar no poder. Mas as eleições já estavam marcadas, o prazo para inscrição dos candidatos já havia vencido, os principais candidatos inscritos eram dois chefes militares, o brigadeiro Eduardo Gomes e o marechal Eurico Gaspar Dutra, sendo que este último fora ministro da Guerra do governo. Além disso, Getúlio havia declarado várias vezes que não seria candidato.
Depois de muita pressão, que contou, inclusive, com um pronunciamento do embaixador estadunidense, Adolf Berle Jr[87], a cúpula militar unificou-se em torno da saída de Getúlio, assumindo em seu lugar, para presidir as eleições, o presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares.
o interregno Dutra e as oscilações na política econômica
Nas eleições de 1946, foi eleito Presidente da República o candidato apoiado por Getúlio Vargas, o marechal Eurico Gaspar Dutra, que se candidatara pelo PSD. Ao mesmo tempo, inscrito como candidato a senador e a deputado federal, Getúlio elegeu-se senador por São Paulo e Rio Grande do Sul e a deputado federal por nove Estados[88].
Mesmo havendo integrado a corrente getulista, tendo, inclusive, sido seu ministro da Guerra, Dutra alterou, na fase inicial, aspectos fundamentais do programa que vinha sendo implementado.
Na área social, apesar de manter intocada a legislação trabalhista, não concedeu um único reajuste do salário mínimo em todo o seu governo[89].
Na área econômica, a despeito de haver mantido decisões importantes, como a da construção da Usina de Volta Redonda e a do controle nacional sobre o petróleo e sobre a Fábrica Nacional de Motores, malbaratou as reservas cambiais acumuladas durante a guerra. Além de haver usado as reservas para resgatar antecipadamente dívidas externas futuras, comprometeu-as com a liberalização de importações industriais que autorizara.
A rápida pulverização das reservas e o intenso aumento do coeficiente de importação[90] gerou, nas palavras de Furtado, um forte desequilíbrio externo, que ele caracterizou como uma situação “incompatível com a capacidade para importar”[91]. Ao mesmo tempo, a nova inundação do mercado interno com produtos industriais importados começou a comprometer o esforço industrializante que vinha desde a década anterior.
Diante desse quadro, o governo resolveu agir, a partir de 1947, para conter as importações e corrigir o desequilíbrio externo. Segundo Furtado, ante a solução de desvalorizar fortemente a moeda ou a de introduzir uma série de controles seletivos de importação[92], o governou optou pela segunda alternativa. Essa opção teria se devido ao receio de que a desvalorização da moeda pudesse pressionar a inflação para cima, mas tratou-se “de uma resolução que teve importância básica na intensificação do processo de industrialização do país”[93].
Independente da consciência dos executores do novo programa, o controle seletivo de importações significou basicamente duas coisas:
- a redução relativa das importações de manufaturas acabadas de consumo;
- o aumento das importações de bens de capital e matérias-primas.
Segundo Celso Furtado,
o setor industrial era assim favorecido duplamente: por um lado, porque a possibilidade de concorrência externa se reduzia ao mínimo através do controle das importações; por outro, porque as matérias-primas e os equipamentos podiam ser adquiridos a preços relativamente baixos[94].
E, assim, enquanto a importação de bens industriais consumidos pelas camadas de altas rendas caía, no total das importações, de mais de 13% em 1947 para 7% em 1950, as importações de equipamentos industriais subiram 338% de 1945 a 1951[95].
Essas medidas não apenas ajudaram a manter o esforço de industrialização, como o aceleraram, trazendo como conseqüência a intensificação do crescimento econômico: o produto real per capita, que crescera a 1,9% ao ano entre 1940 e 1946, passou a crescer a 3% de 1947 a 1949[96].
o retorno de Getúlio e a industrialização pesada
Através das eleições de outubro de 1950, Getúlio Vargas retornou ao poder. Obteve no pleito 48,7% dos votos contra 29,7% do candidato da UDN e 21,5% do candidato do PSD[97]. A oposição udenista ainda tentou impedir sua posse alegando que não obtivera maioria absoluta dos votos, mas, sem respaldo na Constituição, na sociedade e nas Forças Armadas, não atingiu seu intento.
Em entrevista dada três meses antes das eleições, ao jornal Folha da Noite, Getúlio definiu a concepção que nortearia seu governo: “empenhar-me-ei a fundo em fazer um governo eminentemente nacionalista. O Brasil ainda não conquistou a sua independência econômica e, nesse sentido, farei tudo para consegui-lo”[98].
A independência econômica seria obtida, em grande medida, através da implantação da indústria de base, consciência que já se esboçara no período anterior.
A industrialização começou, fundamentalmente, pela produção de bens de consumo necessário (setor IIa)[99]. Essa industrialização começou a exigir progressivamente mais e mais meios de produção (setor I), dos quais não havia produção interna adequada.
Entretanto, a eclosão da II Guerra Mundial, agravada pela crise cambial que enfrentou a economia brasileira no imediato pós-guerra, dificultou o abastecimento de meios de produção pela via da importação. Tal fato abriu as brechas para um embrionário desenvolvimento interno do setor I[100], que, na fase inicial, se concentrou principalmente na produção de insumos básicos e bens intermediários[101].
Mas Getúlio Vargas, consciente da necessidade do desenvolvimento interno do setor de meios de produção dentro de uma estratégia de independência nacional, adotou, em seu segundo governo (1951-54), uma série de medidas visando a sua promoção. Diz Oliveira:
É deste ponto de vista que se entende o bloco de atividades produtivas, que se materializaram sob a forma de empreendimentos estatais, consubstanciados na criação da Petrobrás, na entrada em operação da Companhia Siderúrgica Nacional, na tentativa de pôr em funcionamento a Companhia Nacional de Álcalis, na já modesta performance da Companhia Vale do Rio Doce e no projeto da Eletrobrás, enviado ao Congresso nacional e apenas aprovado dez anos após[102].
Trata-se, como se vê, de iniciativas destinadas basicamente à produção de insumos básicos e bens intermediários, mas, através da Instrução 70 da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC) e da reforma cambial de 1953, o governo buscou encarecer os bens de capital importados a fim de estimular sua produção interna[103]. Para fomentar o desenvolvimento do setor I, Getúlio criou o Fundo de Reaparelhamento Econômico e o Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDE).
Essas medidas propiciaram a aceleração do crescimento econômico que já vinha desde o começo dos anos 1930. O produto real per capita, que crescera a 3% ao ano no período de 1946 a 1949, passou a crescer a 3,5% no período de 1949 a 1954[104]. Além disso, aumentou sensivelmente a participação da indústria de base na estrutura industrial brasileira. Não temos dados para o final do governo de Vargas, em 1954, mas a comparação entre 1949 e 1958 dá uma indicação desse movimento: as indústrias mecânicas, metalúrgicas, de material elétrico, de material de transporte e química aumentaram sua participação de 22% em 1949 para 38% em 1958, enquanto as de minerais não-metálicos, papel, papelão e borracha subiram de 8% para 10%[105].
O desenvolvimento do setor IIa se dava basicamente sob o controle de um empresariado nacional nascente, que se desenvolvia no próprio processo de industrialização. Por outro lado, o Estado assumiu, no fundamental, o encargo de implementar o setor I[106].
Essa industrialização deu-se sob controle nacional porque o governo de Getúlio tinha como objetivo aumentar a autonomia econômica do País, mas tornou-se possível, em grande medida, em face da situação em que se encontrava a economia mundial na época.
Dada a Grande Depressão de 1929/30, seguida pela II Guerra Mundial, o capital dos países centrais encontrou dificuldades para participar do processo de industrialização dos países da periferia. Além disso, no pós-guerra, esse capital, então sob a hegemonia dos EUA, se dirigia preferencialmente para a Europa e Canadá, sendo também em grande medida deslocado para a indústria bélica nos próprios EUA, como conseqüência do clima de “guerra fria” e da guerra contra a Coréia. Por outro lado, a parcela desse capital que seguiu sendo exportada para a América Latina no período se destinava basicamente a outros ramos que não a indústria[107].
Por tudo isso, o desenvolvimento industrial no Brasil até a primeira metade dos anos 1950 pôde dar-se sob controle de um empresariado nacional nascente em associação com o Estado nacional. Este, além de promover o desenvolvimento do setor I interno, atuava no sentido de regular transferências de capitais e excedentes econômicos do setor agroexportador para o setor industrial[108].
Tal forma de desenvolvimento econômico havia propiciado o avanço de uma ideologia nacionalista, que influenciava importantes parcelas da sociedade e chegara ao poder de Estado com Getúlio Vargas.
Entre as medidas de caráter nacionalista adotadas por Getúlio, estavam, além da criação da Petrobrás, do envio de projeto ao Congresso com vistas à criação da Eletrobrás e da tentativa de desenvolver internamente o setor I, o envio, em janeiro de 1952, ao Congresso Nacional, de projeto de lei visando limitar em 10% do capital investido a remessa de lucros para o exterior[109].
situação internacional adversa
No entanto, o aprofundamento das medidas nacionalistas teria que enfrentar, a partir da década de 1950, uma situação internacional adversa, em face de importantes modificações ocorridas nos países centrais no pós-guerra e que passaram a operar principalmente a partir daquele momento. Consolidara-se a hegemonia dos EUA no campo capitalista, haviam-se formado as grandes corporações transnacionais, estavam-se realizando importantes avanços tecnológicos e generalizara-se nos países desenvolvidos a chamada sociedade de consumo de massas.
Os importantes avanços tecnológicos, ao lado da sociedade de consumo, levavam à rápida obsolescência dos equipamentos industriais, principalmente nos ramos ligados aos bens de consumo “de luxo”(setor IIb). Nessa mesma época, o Japão e a Alemanha, que haviam tido seu aparelho produtivo destruído durante a guerra, o estavam reconstruindo com tecnologias mais modernas descobertas durante o período bélico. A eventual manutenção nos EUA de equipamentos com tecnologia do começo do século – portanto, obsoleta – poderia eliminar da competição as empresas que os possuíam.
A atualização tecnológica nos EUA exigia, portanto, ou o abandono de fábricas inteiras – o que seria desvantajoso para as empresas – ou sua exportação para países ou regiões de menor grau de desenvolvimento. Acabara-se também a fase mais pesada da “reconstrução européia”, liberando enormes massas de capitais estadunidenses. As transnacionais que se criavam começaram a buscar novos campos de inversão rentável, particularmente nos países com capacidade de absorver tecnologia intermediária, já tornada obsoleta em seus países de origem.
Entre os países com essa capacidade de absorção, estava precisamente o Brasil. Ocorreu, então, importante ofensiva do capital estrangeiro em direção a esses países, tendo as grandes corporações estadunidenses como ponta-de-lança[110].
Entre nós, essa ofensiva esbarrou na resistência de um governo de caráter nacionalista, então presidido por Getúlio Vargas, respaldado em intensa mobilização social e política em defesa dessas teses.
Destacou-se na época, a campanha de “O petróleo é nosso”, que defendia a nacionalização e o domínio estatal sobre a prospecção e extração do petróleo. A mobilização popular, deflagrada pelo Clube Militar, terminou fazendo com que a lei aprovada no Congresso (lei 2004), com base no substitutivo elaborado pelo deputado petebista Euzébio Rocha, tenha não apenas criado a Petrobrás, como propunha Getúlio, mas estabelecido o domínio público da União sobre o petróleo[111].
O governo de Getúlio passara, pois, a representar um forte obstáculo à expansão do capital estrangeiro no País. Pressionado desde fora pelo governo dos EUA e de dentro por parcelas da UDN[112], Getúlio passou a combinar a continuidade de seu projeto nacional (como a criação da Petrobrás e do BNDE, além do envio do projeto de criação da Eletrobrás) com determinadas concessões aos EUA (como a formação da Comissão Mista Brasil-EUA e a prorrogação do Acordo Militar Brasil-EUA).
Foi nesse quadro que, em 1954, aproveitando-se de um incidente que provocou a morte de um dos guardas-costa de Carlos Lacerda, a oposição pressionou pela renúncia de Getúlio Vargas.
Em lugar de renunciar, Getúlio deu um tiro no próprio peito. A mobilização nacional que se seguiria, além de impedir o golpe que se arquitetara, garantiu a vitória, nas urnas, do candidato à Presidência que havia lançado para sucedê-lo e que era respaldado pelas mesmas forças sociais e políticas que apoiavam seu governo: Juscelino Kubitschek. JK, como tornou-se conhecido, elegeu-se a 3 de outubro de 1955 com 3 milhões de votos, pelo PSD, tendo como vice João Goulart, presidente do PTB e herdeiro político de Getúlio.
Exercícios:
- Mostre as causas do estrangulamento externo e do esgotamento do modelo agro-exportador baseado no café em 1929-30.
- Indique as principais medidas do programa econômico-social do primeiro governo de Getúlio Vargas, apontando quais suas conseqüências.
- Qual o mecanismo adotado pelo governo de Vargas para garantir a demanda agregada e o nível de emprego durante a crise deflagrada em 1929-30?
- Indique as medidas adotadas para viabilizar o deslocamento do eixo dinâmico da economia brasileira para a indústria.
- Mostre por que a indústria de base e o mercado interno foram os pilares da industrialização por substituição de importações.
- Demonstre quais os problemas gerados na economia brasileira na primeira fase do governo Dutra e como ele enfrentou esses problemas.
- Detalhe as medidas adotadas no segundo governo Vargas para viabilizar a industrialização pesada.
- Por que, durante o segundo governo Vargas, a situação internacional era adversa ao seu programa de governo?
Nacional-desenvolvimentismo… (trata-se do primeiro capítulo do livro do autor “Economia brasileira contemporânea- de Getúlio a Lula”, São Paulo, Atlas, 2007)
[1] Trata-se de um tratado comercial firmado em 1703 entre Portugal e Inglaterra, através do qual Portugal dava preferência aos produtos industriais ingleses, enquanto a Inglaterra favorecia os vinhos e azeites portugueses. Segundo Celso Furtado, “esse acordo significou para Portugal renunciar a todo desenvolvimento manufatureiro e implicou transferir para a Inglaterra o impulso dinâmico criado pela produção aurífera no Brasil” (Furtado, Celso. Formação econômica do Brasil. 11ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971, p. 34). Ver também: “Em suas memórias, o Marquês de Pombal afirma categoricamente que a Inglaterra havia reduzido Portugal a uma situação de dependência, conquistando o reino sem os inconvenientes de uma conquista militar” (Ibid., p. 35, nota 38).
[2] Ibid., p. 35.
[3] Registre-se que, na fase inicial da República, durante os mandatos dos marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, seus ministros da Fazenda, Rui Barbosa e Serzedello Correia, ensaiaram um programa de industrialização, que, no entanto, foi abandonado a partir de 1894, quando os cafeicultores paulistas, através de Prudente de Moraes e Campos Salles, assumiram o comando do poder político no País e passaram a adotar um programa econômico inteiramente voltado para o fortalecimento da cafeicultura.
[4] O acordo de Taubaté, firmado entre os cafeicultores e estados produtores de café em 1906 para a defesa e valorização do produto, implicava na tomada de empréstimos junto aos bancos ingleses para viabilizar a aquisição dos excedentes (Furtado, Celso. Formação econômica do Brasil. 11ª ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1977, p. 179-85.
[5] Referimo-nos à maior crise econômica que assolou a economia capitalista; deflagrada pelo colapso da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929,generalizou-se para o conjunto do mundo capitalista ao longo da primeira metade dos anos 1930.
[6] Até então, o Brasil já experimentara vários surtos de industrialização, como na época da mineração (século XVIII), quando da adoção das tarifas protecionistas implantadas pelo ministro Alves Branco (1844), na fase inicial da República (1889-1894) e durante a I Guerra Mundial, mas, em nenhum desses momentos, a industrialização se consolidou.
[7] Porque, em sua fase inicial, passou a produzir internamente produtos industriais antes importados.
[8] Por que as forças políticas que o vanguardearam defendiam um desenvolvimento nacional autônomo para a economia do País. Ver a respeito Bielschowsky, Ricardo. O Pensamento econômico brasileiro; o ciclo ideológico do desenvolvimentismo. 2ª. Ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995, p. 77-179.
[9] Na década de 1840, a exportação de café já representava 40% das exportações brasileiras, passando a ser o primeiro produto de exportação (Furtado, op. cit., p. 113).
[10] Ibid., p. 142.
[11] Na verdade, para sermos mais precisos, a economia agro-exportadora do café já se esgotara no começo do século. Sua continuidade, a partir de então, decorreu do artifício da compra do excedente estabelecida no Acordo de Taubaté, em 1906, o qual engendrou um forte endividamento externo do País.
[12] Em 1906, os cafeicultores e os governos dos estados cafeeiros, sobretudo São Paulo, haviam firmado o Acordo de Taubaté, o qual, para garantir a valorização do produto, estabelecia a formação de um fundo financeiro para a compra do excedente; os recursos para abastecer o fundo provinham de empréstimos fornecidos pelos bancos ingleses (Furtado, op. cit., p. 179-85).
[13] Furtado, op. cit., p. 181.
[14] Ibid., p. 184.
[15] O principal deles foi a Semana de Arte de Moderna, realizada em 1922, que deu origem a um movimento cultural que buscava a identidade nacional.
[16] Os principais deles foram a revolta do Forte de Copacabana, em 1922; o levante de 1924 em São Paulo; e a Coluna Miguel Costa-Prestes, iniciada em 1926.
[17] Essa foi a data da quebra da Bolsa de Nova Iorque, que desencadeou a Grande Depressão.
[18] “Com o início da Depressão, o café era responsável por 71% do total das exportações” (Baer, op. cit., p. 54).
[19] Segundo Furtado, o quantum das exportações cresceu apenas 10% de 1920 a 1929 (Furtado, op. cit., p. 184, nota 156).
[20] O quantum das importações cresceu 100% de 1920 a 1929 (Ibid.).
[21] As contas externas são registradas no balanço de pagamentos, que se define como a contabilidade do conjunto das transações econômicas entre residentes e não-residentes de um país, ou entre o país e o resto do mundo, por um determinado período, geralmente de um ano.
[22] Tavares, Maria da Conceição. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro; ensaios sobre economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1973, p. 63-7.
[23] Furtado, op. cit., p. 186-7.
[24] Ibid., p. 187. A saca de café, por sua vez, caiu de 4,71 libras em 1929 para 1,80 libra em 1932-34, representando uma baixa de 62% (Ibid., p. 187, nota 160).
[25] Baer, Werner. A economia brasileira. Tradução de Edite Sciulli, 2ª ed. São Paulo: Nobel, 2002, p. 54.
[26] O poder de compra das exportações expressa a multiplicação da quantidade exportada pela relação de troca ou termo de intercâmbio, que, por vez, indica a relação de preço entre os produtos exportados e os importados.
[27] Tavares, op. cit., p. 64, tabela.
[28] É a conta do balanço de pagamentos que registra as remunerações de fatores estrangeiros, como remessa de lucros, de juros e dividendos; fretes internacionais, turismo, royalties.
[29] Os compromissos com a dívida externa, sem contar as remessas dos lucros de entidades privadas, ascendiam a US$ 1,3 bilhão em 1931 (Baer, op. cit., p. 54).
[30] É a conta do balanço de pagamentos que registra o movimento internacional de capitais, como empréstimos externos (e sua amortização), investimento direto estrangeiro e aplicações em carteira.
[31] Reservas em ouro, moeda estrangeira e obrigações de outros países.
[32] Furtado, op. cit., p. 187.
[33] Furtado, op. cit., p. 192. A queda da renda só não foi maior porque a redução da quantidade exportada de café foi menor do que a queda de seus preços. Enquanto os preços caíram cerca de 60%, a quantidade exportada o fez em apenas 16,41% (de 859 mil toneladas inglesas em 1929 para 718 mil em 1932 (Baer, op. cit., p. 64).
[34] Na época, chamavam-se de presidentes aos governadores dos Estados.
[35] Usava-se o termo pejorativo “voto de cabresto” para caracterizar o fato de que a decisão do voto no interior (que na época abrigava a grande maioria da população) costumava caber aos “coronéis”, título atribuído aos grandes proprietários de terra. Na época, apenas 2% da população votava.
[36] O então presidente interino do Rio Grande do Sul, Oswaldo Aranha, respondendo ao telegrama do presidente da República, Washington Luiz, que lhe comunicara a vitória de Júlio Prestes, declarou: “Fechar as urnas, negar boletins, não instalar mesas, recusar fiscais, adulterar resultados, afugentar eleitores, comprar votos, fasear alistamento, invadir as mesas com policiais, arrebatar livros eleitorais e procurações de candidatos, fazer eleição antecipada, não aceitar votação em cartório, sonegar, enfim, ao cidadão o direito de votar ou forçá-lo contra a sua consciência, são fatos degradantes (…) Tenho, infelizmente, de fatos similares, denúncias documentadas em relação a muitos Estados, especialmente São Paulo, Maranhão, Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, Paraná e Sergipe” (cit. in Frischauer, Paul. Presidente Vargas – Biografia. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1943, p. 250-1).
[37] O episódio tinha conotação marcadamente local, mas terminou assumindo dimensão nacional em face do papel nacional que cumprira Pessoa (candidato a vice-presidente) e do quadro de crise em que se encontrava o País.
[38] Silva, Hélio. Getúlio Vargas; 15º Presidente do Brasil. Coleção “Os Presidentes”. São Paulo: Grupo de comunicação Três, 1983, 1ª parte: 1930-1937, p. 31.
[39] Frischauer, op. cit., p. 244-5.
[40] Silva, op. cit., p. 32.
[41] Baer, Werner. A economia brasileira. Tradução de Edite Sciulli. 2ª ed. São Paulo: Nobel, 2002, p. 54.
[42] Ibid., p. 54.
[43] Tavares, op. cit., p. 67
[44] Ibid., p. 67.
[45] A depreciação da nossa moeda chegou a alcançar 40% (Furtado, op. cit., p. 187).
[46] Segundo Celso Furtado, de 1929 ao ponto mais baixo da depressão, “o índice de preços dos produtos importados subiu em 33 por cento” (Furtado, op. cit., p. 197).
[47] Baer, op. cit., p. 54.
[48] Furtado, op. cit., p. 197.
[49] Baer, p. 54.
[50] Baer, op. cit., p. 54-5.
[51] Eles queriam aumentar em 50% o preço do produto, de 8 centavos de dólar por libra-peso para 12 centavos.
[52] Furtado, op. cit., p. 188 e p. 192-4.
[53] Segundo Furtado, “a produção prevista para os dez anos seguintes excedia, com sobras, a capacidade previsível de absorção dos mercados compradores”(Ibid., p. 189).
[54] Ibid., p. 189.
[55] Gremaud, Amaury Patrick et alii. Economia brasileira contemporânea. 6a. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 366, tabela 14.1.
[56] Para isso, além da política de erradicação de cafezais, praticou-se o que ficou conhecido como “confisco cambial”, que, além de reduzir a rentabilidade do setor, transferia renda para a indústria.
[57] Gremaud et alii, op. Cit., p. 366, tabela 14.1.
[58] Ibid.
[59] Furtado, op. Cit., p. 192.
[60] Ibid., p. 192.
[61] Ibid., p. 198.
[62] Furtado, op. Cit., p. 189, 193.
[63] Os surtos industriais foram os seguintes: 1) no século XVIII, durante o ciclo da mineração; 2) na década de 1840, depois da instituição das tarifas alfandegárias Alves Branco; 3) na década de 1890, depois que, na primeira fase da República, os ministros da Fazenda, Rui Barbosa e Serzedelo Correia, adotaram um programa industrializante; 4) durante a I Guerra Mundial, graças ao protecionismo natural ensejado pelo conflito bélico.
[64] Tavares, op. cit., p. 67-72.
[65] Bielschowsky, Ricardo. Pensamento econômico brasileiro; o ciclo ideológico do desenvolvimento. 2ª ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 1995, p. 252.
[66] Foi presidente da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (FIESP) e fundador e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)
[67] Bielschowsky, op. cit., p. 37-76.
[68] Simonsen, Roberto. Evolução industrial do Brasil e outros estudos. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1973, p. 288.
[69] Bielschowsky, op. cit., p. 37-76.
[70] Furtado, op. Cit., p. 201, nota 166.
[71] Registre-se que, depois de uma reanimação inicial, a economia dos países desenvolvidos voltou a declinar novamente: nos EUA, por exemplo, a renda per capita caiu sensivelmente de 1929 a 1937 (Ibid., p.201).
[72] Ibid., p. 200.
[73] Grande Enciclopédia Larousse Cultural, verbete “Brasil”.
[74] Indústria que produz meios de produção: máquinas, equipamentos, insumos básicos, bens intermediários.
[75] Na época, presidido por Franklyn D. Roosevelt.
[76] Essa lei obrigava as empresas a empregarem 2/3 de brasileiros.
[77] Antes, a questão social era tida como um “caso de política”.
[78] Antes, a jornada era de 12, 14, 16 horas de trabalho.
[79] Medida pela relação entre os investimentos brutos e o total do dispêndio nacional.
[80] Furtado, op. cit., p. 221-2.
[81] Até então, as mulheres não votavam no Brasil.
[82] Antes, quem comandava e fiscalizava as eleições eram os representantes do governo na localidade.
[83] Vargas, Getúlio. Diário. Apresentação de Celina Vargas do Amaral Peixoto. São Paulo: Siciliano; Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1995.
[84] Cit in Silva, op. cit., p. 98.
[85] Em Natal, capital do Rio Grande do Norte, em Recife e no Rio de Janeiro.
[86] O movimento devia seu nome à bandeira das bases getulistas que pregava: “Queremos a Constituinte com Getúlio”.
[87] Hilton, Stanley. O ditador & o embaixador – Getúlio Vargas, Adolf Berle Jr e queda do Estado Novo.
[88] Naquela época, os apoiadores de um candidato poderiam inscrevê-lo a vários mandatos; depois de eleito, ele deveria escolher o mandato de seu interesse ou preferência. Getúlio escolheu a vaga de senador do Rio Grande do Sul.
[89] A legislação da época determinava que os reajustes deveriam ser trianuais. Como o último reajuste de Getúlio fora em 1943, deveria ter ocorrido um em 1946 e outro em 1949.
[90] Coeficiente de importação é a relação entre o valor das importações e o valor do Produto Interno Bruto. Este havia baixado de 14% em 1929 para 8% em 1933 e voltou a subir para 15% em 1947 (Cf. Furtado, op. cit., p. 197, 217).
[91] Ibid., p. 217.
[92] O autor deixou de assinalar uma terceira alternativa: elevar as tarifas de importação.
[93] Furtado, op. cit., p. 217.
[94] Ibid., p. 218.
[95] Furtado, op. cit., p. 219, 220.
[96] Ibid., p. 218, nota 179.
[97] O candidato da UDN mais uma vez foi o brigadeiro Eduardo Gomes; quanto ao do PSD, Cristiano Machado, no meio da contenda parte de seu partido decidiu apoiar Getúlio, passando esse gesto a ser conhecido na historiografia política brasileira como “cristianização”.
[98] Cit. in Silva, Hélio. Getúlio Vargas; 17º Presidente do Brasil (1946-1954). Coleção “Os Presidentes”. São Paulo: Grupo de Comunicação Três, 1983.
[99] Em 1949, 55% do valor da produção industrial correspondia aos ramos de têxtil, vestuário e produtos alimentícios (cf. Pignaton, A.G. Álvaro. Capital estrangeiro e expansão industrial no Brasil. Brasília: UnB, Departamento de Economia, set. 1973, p. 50).
[100] Cf. Oliveira, Francisco de & Mazzuchelli, Frederico. “Padrões de acumulação, oligopólios e Estado no Brasil ( 1950-1976)”. In: Oliveira, Francisco de. A economia da dependência imperfeita. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 1977, p. 76.
[101] Em 1949, a produção dos ramos de minerais não-metálicos, metalurgia, papel e papelão, ferro e química correspondia a 24,27% do valor da produção industrial. A parte do setor I voltada à produção de máquinas e equipamentos (bens de capital) praticamente inexistia: a participação do ramo de mecânica no valor da produção industrial era de apenas 1,60% e a participação do ramo de material de transporte (então dominada ainda pela produção de bens de consumo duráveis) se limitava a 2,31%. Quanto a um setor especificamente suntuário, ainda não dava sinal de vida: importava-se praticamente tudo o que se consumia (cf. Pignaton, op. cit., p. 50).
[102] Oliveira, op. cit., p. 77.
[103] Cf. Bandeira, Moniz. O governo João Goulart: as lutas sociais no Brasil (1961-1964). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977, 2ª ed., p. 16 e nota 3. Ver também Magalhães, Sérgio. Problemas do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1960, p. 14.
[104] Furtado, op. cit., p. 218, nota 179.
[105] Tavares, Maria da Conceição. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro; ensaios sobre economia brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1973, p. 92 e quadro 6.
[106] Para uma análise do desenvolvimento da empresa estatal no período 1930-1954, assim como de suas causas, veja-se Breitman, Doris. Consideraciones críticas sobre el papel de la empresa estatal en Brasil, México, FCP & S-UNAM, 1978 (tese de mestrado). As principais empresas estatais criadas no período foram: Companhia Siderúrgica Nacional, Companhia Vale do Rio Doce, Petrobrás e Companhia Nacional de Álcalis, todas produtoras de bens intermediários.
[107] A taxa média anual de crescimento dos investimentos de empresas estadunidenses na América Latina foi de 6,2% para o período 1950-60 (contra 14,2% para a Europa e 12% para o Canadá) (cf. Fajnzylber, Fernando. Estratégia industrial e empresas internacionais – posição relativa da América Latina e do Brasil. Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1971, p. 29). Por outro lado, em 1950 só 17% do capital estadunidense que se investia na América Latina se destinava à produção de manufaturas (cf. Salama, Pierre. “Especificidades de la internacionalización del capital en América Latina”. In: Crítica de la Economia Política, El Caballito, no. 7, abr.-jun. 1978, p. 132).
[108] Oliveira, Francisco. Crítica à razão dualista, Porto Alegre, UFRGS-FCE-DAECA, 1974-75 (Debates Econômicos 19), esp. Cap. 2
[109] (cf. Machado, Luiz Toledo. Brasil 2002; colônia, império e república; política, sociedade e economia. Lisboa, Universitária Editora, 2003, pp. 239-240).
[110] Ver a respeito nosso livro Ascensão e queda do império americano. São Paulo: CPC-UMES/Mandacaru, 2001, esp. Cap. 2 e 3.
[111] O principal mentor da campanha foi o general Horta Barbosa, que venceu o debate no Clube contra o marechal Juarez Távora e o brigadeiro Eduardo Gomes (cf. entrevista de Fernando Siqueira, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás, ao jornal Tribuna da Imprensa, 02.01.2004).
[112] Lideradas pelo jornalista e deputado Carlos Lacerda.
Nenhum Comentário